sexta-feira, julho 29, 2005

fotonovela - malícia










Casta "Cata".




Estava cheio de Catarina, sua esposa. Lembrava dos tempos de namoro: mulher só é dez no começo. Tudo nela lhe irritava; ora o gênio, ora a pasmaceira, sobretudo o pudor. Ficava ruborizada com revistas femininas. No fundo acreditava que mulher direita não goza, ou, pelo menos é discreta. Tentava imaginar a mãe, muito moderna mas que, olhando direito, era igual a avó.
Não largava dela por ser confortável aquela vida; gostava da "casta Cata", como a chamava ironizando. O que não queria era o tédio. De mais a mais não tinha idade nem disposição para conquistas, chegar em casa sozinho e encarar um cinco-contra-um. Esposa tem suas vantagens, dizia. Se bem que, na adolecência se divertia muito. Tinha vários truques: pintava as unhas e imaginava ser "daquela dona" a mão. Usava luvas de renda da mãe, mas o troféu era uma par de luvas de pelica que a irmã mais velha ganhara em uma viagem ao sul.
- Vou jogar essa madre na mão de um sacana, articulou enquanto lia o guia de tv. Mas quem? Tinha o Túlio, contador do condomínio. Tipão, come quieto, e, diziam, chegado a umas esquisitices. Falou com o sujeito e combinaram uma armação: faz essa mulher subir pelas paredes, combinado? Lógico. Dialogo curto mas que dizia tudo.
Levou a mulher a um baile na academia de dança e deu-lhe um porre de champagne. A pobre acordou ao lado do Túlio. Lembrava ter tido uma noite dos diabos. Só pode ter sido o champagne, pensou, travessa e sorridente como nunca. Resolveu acordar o outro com uma lambida no peito e tirar a prova dos nove. Bingo.
Entrou em casa e deu de cara com o marido na sala com um risinho no canto da boca.
- Gostou? Tem mais um presente no quarto.
Em cima da cama um lindo casaco de peles.
- Vai usar pra ele, na minha frente, sem nada por baixo e sem tirar, entendeu?
Sem entender nada, abraçou o casaco enquanto o marido telefonava para o Túlio. Entendeu menos ainda quando o marido lhe estendeu um par de luvas de pelica e lhe sussurrou no ouvido: hoje vai ter diversão pra todo mundo.

domingo, julho 24, 2005

Da série: "las cantadas" que levarei para o inferno.




Um advogado, por e-mail.


A mensagem:
Olá, gostei de saber que vc olhou o meu perfil. Espero que tenha gostado...!
Gostaria de conhecer mais sobre vc. Adorei o seu perfil, mas quero pedir uma oportunidade de ter um contato mais próximo com vc. Não obstante, e com muita satisfação, que digo que através do seu perfil verifiquei que possui inúmeras qualidades, mas gostaria de conhecer seus defeitos, pois a sabedoria popular diz: ?pode possuir inúmeras qualidades, mas vão te lembrar pelo teu único defeito?. Vei mui respeitosamente auferir essa dialética com vc, não só para pronunciar palavras ao leu, e evitando assim comentários jocosos, pois no bojo dessa minha peregrinação encontrei vc, e me encantei e sinto que se me deres uma oportunidade agarrarei com mãos firmes e cuida que só um homem de verdade pode fazer. Um homem responsável, carinhoso, alegre, espontâneo e alegre, pois está mais do que ínsito minha atração por ti. Deveras não só me deleitar com suas palavras doces e suaves, que registram sua marca em aparente demonstrativo que sucumbe sua imagem, mas torna ela bela e pena... quero pedir através desse instrumento que entre e contato comigo. Meu e-mail é ?---@---.---.--?e meu nome é momomo beijos e um forte abraço nessa em que repousa meus pensamentos ...!

A resposta:
Adorei o que escrevestes, principalmente pelo uso da segunda pessoa e de vocabulário tão interessante. Fez-me voltar aos parnasianos e seu ideal de beleza clássica e medida. Imagino, pelo gosto das belas letras que sejas magistrado e me rendo a tão argentina lida. Quando dizes de tuas mãos firmes a agarrar, ?que só um homem de verdade pode fazer? inevitável me veio certa lubricidade trazida pelos termos. Sucumbi eu às tuas palavras que com tua imagem de busto exposta me fez pensar em, amarradas as suas mãos ao estrado da cama com delicada tira de cetim, pudesse eu transcrever em nanquin tuas palavras na branca pele do teu corpo com finíssimo e macio pincel japonês. Recitarias as máximas da legislatura romana, os tratados de amor de Ovídio no que revelam do prazer dos amantes em via pública. Palavras estas que fatalmente espelhadas em meu corpo, testemunhas tatuadas da proximidade lúbrica de tua tez à minha e dentro de mim, a escrita do teu pênis ereto. Depois lhe vestiria a camisa de linho e dado o nó em tua gravata - nó windsor, para distinguir-te do mais de toda turba - lhe deixaria ir, somente visível uma marca no pescoço a causar inveja aos teus amigos e ciúmes a quem nutre incompleto desejo de ti.

Sli

"Segredos...? Para que servem? Guardar palavras em silêncio? Não se transmitir as emoções? Um segredo é uma emoção guardada dentro das cavidades mais profundas e mais desejadas de teu corpo, uma emoção com medo de ser mostrada para o mundo... Por que ter medo das emoções? Se elas são feitas para serem transmitidas aos que ardem de desejo por vc ,se elas servem para levar alegria, desejo e tesão... Emoção que serve muitas vezes para dizer simplesmente: te quero e quero ficar eternamente dentro de você! No murmúrio de palavras sem nexos, os lábios tremem ainda sob o contato tímido e sorrateiro nos deixando perplexos. Com o olhar em seu olhar,acreditamos que a aproximação de nossas bocas se torna inevitável. Então, no êxtase de nossa união, os reflexos relaxam com o roçar de línguas que tentam buscar um pouco de paixão ou puro tesão.
Não reprimimos...o tempo parece voar. Nossa saliva se mescla com nossa ânsia e o beijo nos faz sentir o que nunca sentimos... Somos um todo e queremos tudo... Amamos,fechamos nossos olhos e sonhamos, teu corpo nu junto ao meu entrelaçados sobre o suor e desejo enquanto meu pênis ereto penetra vc...?

sábado, julho 23, 2005

quadradinhos alazão


metafotografia - fotos de televisão











Historietas

1.
Sabia que não choraria. Era incapaz. Não chorava nunca, daquela vez não seria diferente. Sabia disso, conhecia-o bem, muito bem. Sabia-lhe doendo. Ele também bem sabia e diante da situação não teve como ser de outro modo; vendo que não choraria, arrancou do bolso uma faca e deu dois pequenos talhos, um em cada olho próximo ao nariz. Escorreram duas gotas de sangue. Foi embora. Não olhou para trás. Mais adiante, limpou o sangue em um lenço de linho branco e guardou no bolso. Tempos depois recebia, pelo correio, uma caixa com um lenço manchado de sangue. Nunca ouvira falar de carta de amor mais sincera nem de choro mais sentido.

2.
Estavam ele e uma amiga que o disputava comigo em frente ao palco. Os via a uma distância razoável perto da porta de saída. Ele estava animadíssimo. Em meio àquele povaréu, todos pulando, e, sem camisa, ele suava muito. A garota fingia atenção ao show e se protegia do suor alheio, mas firme no seu propósito de criar uma intimidade, forjar momentos compartilhados. Acabada a apresentação ele comenta alguma coisa com a ela apontando o palco. Veio em minha direção, sorriso de orelha a orelha, abriu os braços e se desabou suado sobre mim. Abracei-o e tratei de esconder meu sorriso. Não quis tripudiar em cima da humilhação de ninguém. De mais a mais, o lugar dela poderia ter sido meu. Meu coração, este sim, bateu no compasso da jugular que pulsava quase na minha boca.

3.
Absorvido, encontrava a ordem das coisas, decifrava aquela realidade como que debruçado sobre um papiro antigo. Vivaz, testava hipóteses, elocubrava possibilidades e com a certeza de um passo a frente de outro, concertava a tomada. Levou vinte minutos naquilo, depois recolheu as ferramentas, pegou um abajur, testou a tomada e me disse: ?olha, deu certo?. Ficou ali parado ainda por algum tempo, tendo em uma das mãos a caixa de ferramentas e na outra o interruptor do abajur. O que era aquilo? Nem comoção havia de ser. O que era aquilo? Era o mais delicado das criaturas. Era o tédio do meu amor eterno. Era o tempo parado das tardes de domingo. Era a revelação de um segredo dito em freqüência tão alta a não ser ouvido. Atividade subterrânea de água que avança a trezentos anos. A delicadeza do seu vigor físico, de sua presença de pedra, de sua carne compacta. Delicadeza dos vinte mil anos de sua espécie e delicadeza é coisa que corta. Esquartejado lhe abraço por trás e pouso meu rosto entre suas omoplatas a lhe aspirar o vapor exalado. Tendo as mãos ocupadas, jogou para trás a cabeça. Lasso, me prendeu em um abraço liberto. Refez-se, largou o interruptor e desembaraçado de mim foi guardar as ferramentas no seu devido lugar. Quando voltou, me encontrou no sofá, sentado com minhas leituras e sem menor cerimônia se aninhou no meu peito e lá ficou. Pegou-me o braço que não segurava livro e passou por sobre o peito. Queria carinho e conseguiu. E era assim, acabou dormindo. Passei a tarde com ele dormindo em meu peito e lendo um livro. Gostava de dormir no meu peito e eu gostava que assim fosse. Acontecia de também dormir e acordar sonhando, puxando os fios dos cabelos dele. Nessa lassidão passávamos dia e noite sem nunca termos queridos isso ou o contrário disso ou outra coisa. Isso é a fartura de dois que não pedem, nem precisam.

4.
Ouvi no ônibus: já não lembro do que me aconteceu, deixei na esquina, no fundo do buraco de corrosão do metal da lata de lixo que fiquei olhando, fixamente, para enxergar o fundo. Deve ter sido isso, o buraco na lata de lixo me chupou o passado. Esqueci de tudo como se houvesse perdido a foto do meu pai morto. Da Iracema só sobraram as meias e os sapatos. O rosto do meu passado amarelou, veio um bicho e comeu. O bolor tomou conta e tudo desapareceu, acabou como acaba o dia, passando, se indo, descendo, sumiu. é mesmo? Queria que fosse o meu destino fatal. Olha, se o seu destino é fatal ou não, não vou me preocupar com isso, se ele for fatal, fatalmente será o seu destino, se não, não deixará de ser seu destino por isso. Acredite, coisas não fatais existem em larga escala, e isso não é religião. Veja, direita - esquerda, frente - trás, é tudo um movimento de cabeça, órbita dos olhos. Anda-se em sentido direito-esquerda, pode ser esquerdo-direita. Andar contra o tempo não altera o sentido do relógio, enfim, não importa, no presente, o passado não existe. E digo contente: memória é bom, esquecimento também. Ai que saco! Tudo isso é saudade. O contrário disso também.


O autor aceita temas para historietas. Garanto que as selecionadas serão tratadas de modo muito especial a satisfazer o leitor/remetente.